Diferentemente do ano passado - quando os veículos comerciais puxaram o desempenho da indústria automobilística -, são os carros de passeio que estão conduzindo as montadoras ao recorde de vendas em 2012. Desta vez, contudo, o brasileiro aproveitou a redução no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para evoluir na motorização e sair das linhas de automóveis mais básicas.
Os carros com motores que ficam na faixa acima de 1.0, até 2.0, foram os que mais venderam, marcando crescimento de 18,4% até outubro e um volume equivalente a 57,5% do mercado. Já o chamado carro popular, de motor 1.0, teve queda de 0,6% nos emplacamentos, na contramão do mercado de automóveis, que está crescendo ao ritmo próximo a 9% neste ano.
Os analistas citam uma série de fatores para justificar esse comportamento, a começar pelos incentivos fiscais que, junto com descontos praticados pelas próprias montadoras, melhoraram o acesso aos carros de maior valor agregado. "Quem antecipou a compra aproveitou o IPI menor para comprar carros maiores e melhores", comenta Raphael Galante, analista da Oikonomia.
Além disso, a seletividade dos bancos na liberação de crédito, sobretudo no primeiro semestre, restringiu uma demanda por carros de entrada que vinha sendo suportada por financiamentos sem entrada, prazos que chegavam a seis anos e alto índice de concessões. Esse cenário prejudicou mais o público de baixa renda do que o consumidor com maior capacidade de arcar com as novas exigências das instituições financeiras.
O resultado foi a derrocada de alguns dos carros mais populares e tradicionais, que perderam espaço para linhas reestilizadas e a chegada de modelos totalmente novos no segmento de compactos, o preferido dos brasileiros.
Números coletados nos dez primeiros meses do ano pela Fenabrave, a entidade que abriga as concessionárias de veículos, mostram que o Gol, da Volkswagen, e o Uno, da Fiat - os dois carros de maior giro do país - registram queda de 2,1% e 3,2% nos emplacamentos, respectivamente. O Celta, modelo de entrada da General Motors (GM), tem recuo de 4,2%, enquanto o Ka, da Ford, aponta declínio ainda mais expressivo - da ordem de 14%.
Por outro lado, as montadoras tiveram em 2012 um ano de festa nas vendas de sedãs, minivans e utilitários esportivos, além das grandes picapes, como a S10, da GM e a Hilux, da Toyota, veículos que se tornaram mais sinônimo de status do que de transporte de produtos.
Os incentivos fiscais, combinados à desaceleração da atividade econômica, levaram o mercado automotivo a sair de um crescimento baseado no transporte de mercadorias e matérias-primas para um desempenho sustentado pelo consumo.
Resultados negativos estão sendo registrados neste ano em segmentos como furgões, peruas convencionais e picapes pequenas, sem contar a retração superior a 21% no mercado de caminhões, também prejudicado pela substituição de linhas que encareceu o preço do produto em até 15%.
No ano passado, a situação foi diferente. Embalados pela evolução do Produto Interno Bruto (PIB) de 2,7%, os veículos classificados como comerciais leves cresceram quase 15% e compensaram a estagnação dos carros de passeio. Em 2012, os carros de passeio inverteram a trajetória e estão crescendo 8,7%, enquanto os comerciais leves sobem menos, a um ritmo de 2,1%.
A inflexão do consumo em direção a veículos mais potentes não é um fenômeno recente no Brasil. Há onze anos, praticamente três em cada quatro carros vendidos no país eram modelos populares. Desde então, esse número vem caindo. No ano passado, os carros com motorização superior a 1.0 passaram a ser maioria nos licenciamentos.
Rodrigo Baggi, economista da Tendências, diz que a melhoria de renda e confiança do consumidor, somada a um quadro de estabilidade nos preços dos carros, abriu o caminho ao aumento da demanda por esses automóveis.
"A melhora no rendimento e bem-estar altera a sensibilidade de consumo e as pessoas passam a consumir e procurar produtos mais sofisticados e que lhe ofereçam maior de segurança" diz o analista, acrescentando que esse comportamento foi fortalecido pelos descontos nos preços dos carros deste ano.
As montadoras, por sua vez, deram vazão a essa demanda com a renovação de linhas e novos produtos nas faixas de mercado acima do segmento popular. A Honda, por exemplo, conseguiu dobrar as vendas do Civic após renovar o sedã médio, enquanto a GM dominou em sedãs compactos como o Cobalt, lançado no fim do ano passado. As projeções da indústria apontam para um crescimento de 4% a 5% nas vendas de veículos neste ano, incluindo caminhões e ônibus na conta.
Por Eduardo Laguna/ Valor Econômico