A inovação é um conceito que sempre orientou o desenvolvimento de empresas líderes. Organizações como a Ford, a GM ou a Toyota buscam priorizar a cultura inovadora em seus modelos de negócios como premissa para se manterem na vanguarda dos mercados. Mas será que uma política de inovação sempre traz resultados positivos?
Após a década de 1950, com o Plano de Metas do governo de Juscelino Kubitschek, a indústria automobilística brasileira vivenciou um momento único em sua história. Grandes montadoras, como a Ford e a Mercedes-Benz, se instalavam no país. A indústria de autopeças se fortalecia, juntamente com o surgimento de novas instituições de ensino técnico e, consequentemente, o desenvolvimento de mão de obra especializada.
Essa rede de desenvolvimento econômico foi a base para a criação de um vigoroso parque industrial que viabilizou a disseminação de novos sistemas organizacionais e a transferência de tecnologias inéditas, resultando em um grande salto para a economia nacional. Foi a partir desse ambiente que surge um personagem símbolo do desenvolvimento tecnológico brasileiro.
A história do engenheiro Amaral Gurgel começa em meados dos anos sessenta, com a produção de carros infantis e karts. Em 1969, a partir de um chassi inovador reforçado com fibra de vidro, a Gurgel Motores surgia com a produção de veículos militares e off-roads, como o Ipanema, primeiro utilitário da fábrica.
Desde o início, a Gurgel já denotava a sua vocação tecnológica. Enquanto nos países mais desenvolvidos da época, a opção elétrica em carros era fruto apenas de estudos futuristas, em 1974, o engenheiro Gurgel já havia projetado o primeiro carro elétrico da América Latina. O Itaipu deveria ser comercializado a um preço equivalente ao de um Fusca 1300 da época. Infelizmente, a sua autonomia de apenas 70 quilômetros e tempo de recarga de mais de 10 horas, fez com que o projeto fosse abandonado ainda na fase de protótipo.
Mas foi na década de 80 que a Gurgel Motores desenvolveu o seu projeto mais audacioso. O projeto denominado CENA (Carro Econômico Nacional) almejava a produção de um carro inteiramente projetado e fabricado no Brasil. Este deveria ser mais econômico, com manutenção mais simples e mais barato que qualquer outro similar. Ele seria para a Gurgel o que o Fusca foi para Volkswagen.
No final de 1987, o carro batizado como BR-800 começou a ser produzido em série e comercializado com o IPI reduzido, ou seja, uma vantagem perante seus concorrentes que operavam com 20% a mais de carga de impostos. Um sucesso de vendas? Nem tanto...
Apesar do bom volume de vendas inicial, a partir de 1990, o governo passa a conceder isenção de IPI para todos os carros similares, fazendo com as vendas do BR-800 despencassem. Neste movimento, rapidamente a Fiat lança o Uno Mille pelo mesmo preço, mas com mais espaço interno e desempenho, tornando-se imediatamente um sucesso de vendas. Em 1992, afundada em dívidas, a Gurgel Motores entrava em concordata decretando o fim de um sonho nacionalista.
O conceito de inovação pode ser variado, mas a premissa básica é que sempre deve gerar vantagens competitivas. Apesar do intenso desenvolvimento tecnológico, a Gurgel Motores não conseguiu obter vantagens que lhe garantissem sustentabilidade econômica. No entanto, o seu legado de pesquisa e desenvolvimento permanece gerando impactos até os dias atuais. Afinal de contas, terá sido a Gurgel Motores uma empresa inovadora?