Japão: indústria parada pode prejudicar cadeia global

A indústria japonesa, prejudicada pelo severo tremor de sexta-feira, enfrenta agora o novo desafio causado pelo racionamento de energia, que forçou até o fechamento de fábricas que não sofreram danos.

Com a interrupção de fábricas que produzem carros, aço, papel e eletrônicos, há também uma ameaça aos fornecimentos ao redor do mundo, pelo menos temporariamente.

As montadoras do país estão praticamente paradas, fechando fábricas que fornecem não apenas carros para o mercado interno, mas também produzem motores e outras peças para linhas de montagem no mundo inteiro. Alguns modelos, como o Prius, da Toyota, só são produzidos no Japão.

As autoridades japonesas disseram que o racionamento de energia começa hoje e deve durar várias semanas, para enfrentar a perda de geração. O premiê Naoto Kan disse que há risco de apagão generalizado, em boa parte por causa dos danos à rede de usinas nucleares do país, que geram quase um terço de sua eletricidade.

Algumas fábricas que produzem eletrônicos, aço e papel também foram paralisadas. As empresas tiveram ainda de enfrentar interrupções nas redes de comunicação e transporte, bem como a necessidade de seus empregados de buscar informação sobre familiares desaparecidos.

A Suzuki Motor Corp., a Mitsubishi Motors Corp. e a Hino Motors Ltd. informaram ontem que paralisarão a partir de hoje a produção em suas fábricas japonesas. Elas se juntaram à Toyota, à Honda Motor Co. e à Nissan Motor Co., que anunciaram sábado planos parecidos. Dezenas de fábricas de autopeças também foram afetadas.

A Toyota vai suspender hoje a produção de todas as suas 12 fábricas japonesas, para dar aos funcionários e fornecedores tempo para verificar se os familiares estão em segurança.

A Mazda Motor Corp. vai suspender a produção de suas quatro fábricas no oeste do Japão hoje à noite, devido à escassez de peças.

A paralisação na produção de autopeças também pode prejudicar a operação das fábricas de montadoras japonesas em outras partes do mundo.

O terremoto também pode diminuir a oferta do híbrido de gasolina e eletricidade Prius, pelo menos no curto prazo. Uma das fábricas que produz peças do modelo foi danificada, informou a Toyota a alguns donos de concessionárias. Uma fábrica que produz compactos que a Toyota exporta para os EUA com a marca Scion também foi danificada, informaram as concessionárias.

Mas é provável que muitas montadoras e seus fornecedores consigam gradualmente transferir mais produção para fábricas nos EUA, na Europa e outros países, para compensar o declínio da produção doméstica. Um analista da indústria automotiva disse que o impacto do terremoto no setor será "administrável".

As fábricas de semicondutores na região do terremoto aparentemente tiveram poucos danos, mas continuavam fechadas ontem por causa de apagões e outros problemas. Entre as empresas afetadas está a Renesas Electronics, a Texas Instruments, a Freescale Semiconductor e a ON Semiconductor.

O maior impacto da paralisação na produção, dizem analistas, pode ser sentido pelos clientes da Renesas, que se fundiu ano passado com a NEC Electronics Corp. A empresa, sediada em Tóquio, é considerada uma das maiores fabricantes de microcontroladores do mundo - os microchips com uma única função simples que são usados para controlar as operações de carros e de vários tipos de equipamentos industriais e de escritório.

Uma porta-voz da Renesas disse que a empresa, que tem instalações no norte do Japão, continuava verificando quais foram os danos, mas, por enquanto, está focada mais é na segurança dos empregados. A Texas Instruments informou que suas fábricas de microchips em Miho e Aizu continuavam fechadas ontem.

Em muitos casos, os microcontroladores de uma empresa podem ser substituídos pelos de outra, disse Len Jelinek, analista da IHS iSuppli. Mas as montadoras geralmente têm só um ou dois fornecedores dos chips mais importantes, que não são fáceis de substituir rapidamente, e também têm pouco estoque desses componentes, disse ele. A paralisação da produção de algumas montadoras no Japão pode suavizar a escassez de microcontroladores, disse Jelinek.

Aparentemente há poucas chances de problemas no mercado de componentes de armazenamento de dados, os chamados chips de memória flash que são usados em produtos como os iPads e iPhones da Apple. As fábricas no Japão da Toshiba e da SanDisk desses componentes - que respondem por cerca de um terço da produção mundial - se localizam a centenas de quilômetros do epicentro do terremoto.

Mas ainda há dúvidas quanto ao impacto do terremoto na produção de telas e dos componentes necessários para fabricá-las. As fábricas japonesas produzem principalmente grandes telas de cristal líquido usadas em televisores, disse Sweta Dash, outra analista da IHS iSuppli, embora ela afirme também que os estoques aparentemente são suficientes para absorver curtas interrupções na produção ou atrasos nas remessas.

Os bancos e as seguradoras do país informaram que pretendem abrir as portas, indicando que o sistema financeiro está funcionando, embora o J.P. Morgan Chase tenha permitido que os funcionários trabalhassem de casa.

Alguns problemas na rede de transportes diminuíram ontem. As maiores companhias aéreas retomaram os voos, bem como as transportadoras United Parcel Services Inc. e FedEx Corp. Mas essas empresas informaram que o transporte de cargas para partes do leste do Japão continuava duvidoso. "Teremos atrasos no serviço em terra no leste do Japão por causa das condições das estradas", disse Chris Stanley, porta-voz da FedEx.

Vários governos pediram que seus cidadãos evitem viagens desnecessárias ao Japão. Empresas como a fabricante de autopeças Robert Bosch GmbH e a Volkswagen AG anunciaram que vão organizar voos para os funcionários que quiserem deixar o país.

A situação num hotel Radisson perto do Aeroporto Internacional de Narita ilustrava bem como os problemas causados pelo terremoto no país estavam passando para uma nova fase. A estrutura do prédio resistiu e o hotel está cheio de hóspedes, muitos deles presos no país devido a atrasos nos voos. Mas o hotel não tem conseguido estocar comida suficiente por causa do fechamento de estradas e a transferência de produtos para áreas mais prejudicadas, como Sendai, disse a porta-voz Molly Biwer. Ela disse que os problemas de suprimento devem aumentar. Os geradores de reserva do hotel ajudariam a diminuir a duração dos blecautes, mas o combustível dos microônibus está escasso.


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