UFSCar cria concreto refratário para siderúrgica

Grupo recebeu o Prêmio Wakabayashi 2009 da Associação Técnica de Refratários do Japão

Foto: Divulgação

O Prêmio Wakabayashi 2009, da Associação Técnica de Refratários do Japão, foi concedido a um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) por conta de um estudo que deu origem a um novo concreto refratário para revestimento de equipamentos da indústria siderúrgica.

Os vencedores da honraria são autores do artigo Microsilica effects on cement bonded alumina-magnesia refractories castables, que foi considerado pela entidade japonesa o melhor trabalho publicado em 2008 na área de materiais cerâmicos para aplicações em altas temperaturas. O estudo foi publicado no Journal of the Technical Association of Refractories.

Os autores são Mariana Braulio, bolsista de doutorado da FAPESP no Programa de Pós-Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais da UFSCar, Victor Carlos Pandolfelli, professor do Departamento de Engenharia de Materiais (DEMa) da universidade, e Luis Rodolfo Bittencourt, diretor técnico da empresa Magnesita Refratários. O trabalho também contou com a participação de Jacques Poirier, professor da Universidade de Orleans, na França.

“O estudo permitiu o aperfeiçoamento de concretos refratários existentes, levando a melhorias no desempenho desses materiais principalmente em ‘panelas para aço’, que são recipientes capazes de transportar até 300 toneladas de metal fundido a uma temperatura de 1.500 ºC”, disse Pandolfelli à Agência FAPESP.

O grupo recebeu certificados e prêmio em dinheiro no dia 20 de abril de 2009 na cidade de Sendai, no Japão, em cerimônia que marcou a abertura do Congresso Internacional de Refratários. A equipe brasileira pesquisa novas tecnologias em concretos refratários para aplicações em siderurgia, petroquímica e na indústria de alumínio – áreas cujos processos envolvem altas temperaturas, contato com materiais corrosivos e grande variação cíclica de temperatura.

No estudo premiado foi desenvolvido um concreto com boas propriedades à alta temperatura e que inibe a reação entre o metal fundido e a cerâmica, contribuindo para o aumento da vida útil do equipamento. O material refratário foi desenvolvido a partir da aplicação de microssílica em pequenas quantidades, combinada com óxidos de magnésio (MgO) e de alumínio (Al2O3).

Segundo o professor Pandolfelli, a tendência de crescimento do setor siderúrgico em todo o mundo tem afetado diretamente o desenvolvimento tecnológico dos materiais refratários. Nesse contexto, destaca-se a utilização dos “concretos refratários espinelizados”, em virtude da sua versatilidade de aplicação e desempenho.

“Por ser refratário, o concreto desenvolvido no trabalho mantém sua integridade física a temperaturas elevadas, superiores a 1.500 ºC, além de ser espinelizado por combinar o óxido de magnésio e o óxido de alumínio, reação que forma uma estrutura cuja fórmula é o MgAl2O4”, detalha Pandolfelli.

Essa reação apresenta caráter expansivo e, por isso, deve ser controlada para evitar danos na estrutura do concreto. Segundo Pandolfelli, o caráter expansivo das reações envolvidas nesses materiais pode trazer benefícios ou problemas no uso. No entanto, apesar desses aspectos, são poucos os estudos que indicam o efeito das matérias-primas sob a expansão e a sua consequência nas propriedades dos concretos.

O estudo da engenharia de microestrutura desses materiais e a obtenção de um mapa de expansão, visando a analisar o impacto dos componentes que constituem esse tipo de concreto refratário, têm importância fundamental para a sua aplicação, o que também foi estudado no trabalho premiado.

“Chamamos esses mapas de expansão de roadmaps, que indicam como mudar a composição de um material para chegar a uma determinada propriedade desejada. Mais do que uma formulação nova, o nosso estudo indica algumas rotas de alteração da formulação do concreto refratário visando a sua adequação a aplicações distintas”, disse.

Pesquisa de ponta
De acordo com Pandolfelli, o concreto refratário desenvolvido já está sendo utilizado em siderúrgicas nacionais. “No entanto, não há uma formulação única e aí reside uma das maiores contribuições do artigo premiado, que é a indicação de rotas para que a composição química do produto seja ajustada e assim obter o melhor desempenho em cada aplicação prática”, aponta.

A linha de pesquisa conduzida na UFSCar resultou, nos últimos oito meses, em dois outros artigos publicados no Journal of the American Ceramic Society, a revista de maior impacto na área de materiais cerâmicos.

Os estudos renderam ainda duas outras publicações em revistas nacionais, três apresentações em congressos no exterior e dois estágios em instituições de pesquisa e indústrias na França e na Holanda, ambos realizados pela pesquisadora Mariana Braulio.

O Prêmio Wakabayashi, que recebe o nome do fundador da Associação Técnica de Refratários do Japão, é a distinção mais importante na área de cerâmicas refratárias.

“Ganhar esse prêmio reflete o reconhecimento e a atenção da comunidade científica internacional às pesquisas realizadas no Brasil. Hoje, os pesquisadores brasileiros estão entre os cinco melhores grupos no mundo na área de materiais cerâmicos refratários”, afirmou Pandolfelli.

O professor da UFSCar foi coordenador de dois Projetos Temáticos da FAPESP na área de cerâmicas refratárias, publicou mais de 400 trabalhos científicos e já recebeu 53 premiações no Brasil, Japão, Alemanha e Estados Unidos.

“Muitos desses prêmios são resultados dos esforços empenhados nos dois Temáticos financiados pela FAPESP, que ainda vêm dando e deram grande notoriedade internacional ao nosso grupo de pesquisa da UFSCar”, destacou.

Os pesquisadores trabalham nessa linha há nove anos com relação direta com os Projetos Temáticos, uma vez que esses contribuíram, segundo Pandolfelli, para “oferecer uma visão sistêmica ao desenvolvimento de concretos refratários avançados”.

“Sem o aporte financeiro da FAPESP não teríamos condições de realizar as pesquisas no nível exigido para obter esse reconhecimento global. Com o auxílio da Fundação também conseguimos formar dezenas de pessoas que participaram desses dois Projetos Temáticos e que hoje estão em empresas sendo nossos parceiros na continuidade dos estudos”, destacou.

O Prêmio Wakabayashi é concedido desde 1983 com o intuito de promover e manter a alta qualidade nas publicações da área. Pandolfelli já havia recebido este prêmio em 2005, quando foi o primeiro pesquisador não japonês a obter a distinção.

“O Japão detém as tecnologias mais avançadas em produção de aço e materiais refratários. É uma honra ser reconhecido por um país que domina essas duas áreas e, por isso, estabelece critérios bastante seletivos para suas premiações”, disse Pandolfelli.

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