Fonte: Agência Estado - 08/09/08
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Existem regras de etiqueta corporativa, na internet, à mesa, cerimonial... e também quando o assunto é dinheiro. Neste caso, principalmente, dizem os especialistas, o cuidado deve ser redobrado. O principal problema está em confundir o amigo com o gerente do banco. “Conversar sobre investimentos com alguém requer intimidade. Não é um assunto que deve ser tratado com qualquer pessoa”, diz o professor de Finanças da Fundação Instituto de Administração (FIA), Keyler Carvalho Rocha.
Para ele, o segredo está na sutileza. Em vez de perguntar diretamente, por exemplo, se a pessoa tem ações de determinada empresa, deve-se pedir a opinião dela sobre a companhia. “Não há nada de mais em perguntar para um amigo ou colega ‘o que você acha da Vale ou da Petrobras?’”, afirma. É uma forma, diz Rocha, de introduzir o assunto sem ser indelicado, ao mesmo tempo em que a pessoa fica à vontade para dizer se investe ou não.
No mercado financeiro há 16 anos, o analista da Souza Barros Corretora, Clodoir Vieira, freqüentemente, é alvo de perguntas indiscretas. “As pessoas querem saber onde aplico meu dinheiro, em quais ações”, conta. Até por uma questão ética, Vieira, neste caso, não pode falar dos papéis que investe para não parecer indicação em interesse próprio.
“Mas além dos clientes investidores, os amigos, muitas vezes, também querem saber”, observa. A resposta, diz Vieira, é sempre diplomática: “Quando querem saber a respeito dos papéis que tenho em minha carteira, desvio o assunto e respondo de forma genérica: invisto no setor de siderurgia, de telecomunicação...”, diz.
Diálogo com ressalvas
O consultor financeiro Fabiano Calil vai além. Para ele, falar sobre dinheiro envolve, também, questões de segurança. Ele admite recomendar o diálogo sobre finanças, mas com ressalvas. “Numa mesa de bar, por exemplo, não se deve comentar o investimento de altas quantias nesta ou naquela aplicação. Nunca se sabe a intenção do cliente da mesa ao lado ou do garçom”, recomenda. Neste caso, diz Calil, o problema está no ambiente escolhido para tratar do assunto. Conversar, por exemplo, sobre investimentos na casa de amigos até pode ser recomendado. “Mas não é o tipo de assunto que devemos conversar em qualquer lugar”, diz.
Em seu escritório, em São Paulo, ele passa, às vezes, pela situação inversa. Muitos clientes relutam em falar sobre seus investimentos. “Os homens, principalmente”. E emenda: “Eles têm arraigada a idéia de provedor. Não precisam de ajuda para cuidar do próprio dinheiro. Geralmente, procuram um consultor financeiro apenas para ‘checar informações’”.
Calil conclui que, respeitadas as regras de etiqueta e bom senso, falar sobre dinheiro é uma boa oportunidade para aprender a lidar com as finanças. Neste caso, ele diz, vale até o investidor perguntar para outro sobre a rentabilidade da aplicação que vem obtendo com determinado papel, desde que a pessoa já saiba do investimento. “Comparar os ganhos é até comum e ajuda a balizar os próprios investimentos”, concorda Vieira, da Souza Barros.
Perguntas demais
Ainda não existe um manual de etiqueta específico para o mercado financeiro, mas Rocha e Vieira aprovam a idéia. “Este nicho cresceu muito nos últimos anos. Um manual de etiqueta ajudaria a evitar muitos constrangimentos”, avalia Vieira.
A consultora de etiqueta Lígia Marques é enfática e diz que qualquer assunto que envolva dinheiro, quase sempre, remete a gafes. “Perguntar quanto a pessoa ganha, qual é o seu salário e como costuma gastá-lo ou aplicá-lo sempre será deselegante. Mesmo com pessoas mais íntimas podemos ir até certo ponto, desde que a conversa esteja dando abertura para isso”, reforça. Na dúvida, portanto, quando o assunto é dinheiro, seja discreto e evite fazer perguntas demais.