Setor naval busca talentos para gestão mais moderna

Se a indústria petroleira no Brasil atravessa uma fase de estagnação e mesmo de demissões, a naval e de apoio marítimo, que geralmente vem a reboque, tem passado por um período bem mais favorável. Isso acontece porque, mesmo sem novos projetos da Petrobras sendo aprovados, muitos outros já estão em andamento.

De acordo com Fernanda Amorim, sócia da empresa de seleção de altos executivos Odgers Berndtson no Brasil, o setor naval começou a crescer há cerca de três anos e não se desaqueceu. Para dar conta da demanda por diversos tipos de embarcação, boa parte das companhias de construção naval passou a profissionalizar seus quadros de gestão e a reforçar seus times de mão de obra técnica. "A estruturação dos processos está mais industrializada e com um foco em rentabilidade. Os investidores esperam retornos maiores e mais rápidos", diz.

Ao buscar profissionais, essas empresas, geralmente sediadas no Rio, têm enfrentado dificuldades devido às particularidades do segmento. A gestão de recursos humanos, por exemplo, precisa entender de aspectos como os turnos de trabalho das tripulações das embarcações. Além disso, o departamento está passando por profundas transformações nessa indústria. "A criação de planos de cargos e salários e a implementação de benefícios são tendências cada vez mais fortes", diz Fernanda.

O radar da procura por talentos na maioria das vezes não rastreia outros ramos de negócio e se limita ao próprio setor naval - sobretudo para os cargos que requerem conhecimento técnico. Mesmo assim, profissionais do setor "vizinho" de óleo e gás têm se sido uma alternativa, acirrando a disputa pelos melhores talentos.

Uma das saídas encontradas pelas companhias para ampliar suas equipes é combinar funcionários de perfis complementares, de acordo com Daniel Linhares, diretor de gente e gestão do grupo CBO - Companhia Brasileira de Offshore. Em sua opinião, é difícil encontrar um profissional que tenha conhecimento técnico - necessário pelas características do negócio - e competências de gestão. "É preciso saber compor o time", diz.


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Isso aconteceu na CBO, que, segundo Linhares, tem planos agressivos de crescimento para os próximos anos, movidos pela venda do grupo para dois fundos de private equity em dezembro do ano passado. Foi por intermédio de um deles - o Vinci Partners - que o executivo, com passagem pela Vale entre 2001 e 2007, assumiu o cargo atual.

Em sua própria diretoria, ele aplica a lógica da composição do quadro com profissionais de habilidades distintas. "Trouxe pessoas com conhecimentos de metodologias, ferramentas de avaliação de desempenho e de cargos e salários. No entanto, mantive quem entende das particularidades do setor, como a folha de remuneração dos marítimos, que têm uma rotina bastante específica", afirma.

O objetivo é equilibrar esforços para implementar na empresa um modelo de remuneração variável mais agressivo. "O segmento naval e de apoio marítimo ainda é muito 'old school' e possui poucas práticas de gestão modernas. Há salários muito altos e, geralmente, os ganhos variáveis são muito baixos ou inexistentes", ressalta.

Rafael Faria, diretor e sócio da Fesa, companhia de recrutamento de executivos, calcula que um gerente pleno nesse mercado esteja em uma faixa salarial entre R$ 25 mil e R$ 30 mil mensais. O especialista também identifica a falta de executivos capacitados para atuar no setor e diz que já viu empresas buscarem profissionais até em segmentos como o de mineração. "As empresas querem uma gestão mais efetiva em termos de custos operacionais e de manutenção", diz.

Entre as exigências mais comuns dos empregadores para quem pretende trabalhar nessa indústria estão boas relações comerciais com os principais contratantes e agências controladoras do setor. A falta de profissionais passa também pela área do direito, segundo Ronaldo Lima, diretor comercial da CBO e presidente da Associação Brasileira das Empresas de Apoio Marítimo. "Há uma carência muito grande de advogados que conheçam direito marítimo e legislação tributária. Trata-se de uma especialização bastante complexa", afirma Lima, que tem notado a migração também de executivos que fizeram carreira na área administrativo-financeira para a naval.

Relações com players do segmento é algo que se conquista com o tempo. Dessa maneira, não é de se estranhar que se busquem executivos já atuantes no setor para as vagas de gestão. Graduado em engenharia civil, Lima conta que, no começo da década de 1980, passou a trabalhar em um estaleiro devido à baixa demanda por profissionais de sua área de formação. Em 1991, foi convidado para presidir uma empresa de apoio marítimo, na qual ficou por 16 anos. Depois, se transferiu para a CBO, onde está há quase dez.

O executivo afirma que há um "gap" na formação de engenheiros navais, muito devido à estagnação do mercado de construção naval no final da década de 1980 e nos anos 1990. "Sem emprego, vários engenheiros foram abrir pizzarias em Niterói. No início dos anos 2000, houve uma retomada no aquecimento do mercado de construção de barcos de apoio", afirma.

Foi depois disso que a carreira do português Francisco Nunes Neves, atualmente CEO da Bravante, empresa de apoio marítimo, construção e reparo naval e proteção ambiental, enveredou pela área. Sua trajetória começou nos anos 1990 na Brahma (atual Ambev), onde trabalhou por cerca de três anos na área de vendas. "Em 2001, decidi aceitar o desafio de atuar na área de logística portuária e ferroviária da Vale", lembra.

O executivo entrou na companhia como diretor e saiu em 2007, em busca de novas oportunidades profissionais. Por sete meses foi presidente da Cemar - Companhia Energética do Maranhão. Em seguida, foi para a Odebrecht, onde se tornou responsável pela área portuária da OTP, braço de infraestrutura do grupo. No fim de 2011, assumiu a presidência de uma empresa de gerenciamento de resíduos, até ser contratado pela Bravante.

O que mais o atraiu na empresa, segundo ele, foi o ritmo acelerado de crescimento. "Há um programa de construção de 15 novos barcos, decisão tomada nos últimos quatro anos. Percebi que era um momento muito favorável na indústria". Neves afirma que sua experiência foi decisiva para ocupar o cargo de CEO. "Trouxe um modelo de gestão que aprendi ao longo de minha vida profissional, calcado em três pilares: pessoas treinadas e motivadas, disciplina nos processos para a entrega do melhor serviço e a constituição de um negócio que seja rentável para os sócios", enfatiza.

Na avaliação de Ronaldo Lima, da CBO, a frota do setor de apoio marítimo, que atualmente conta com cerca de 500 embarcações, deve chegar a cerca de 700 até 2020. Neves, da Bravante, estima a necessidade de um contingente de 200 a 250 novos barcos para os próximos cinco ou sete anos. E construí-los no Brasil, de acordo com Fernanda Amorim, sócia da Odgers Berndtson, acaba sendo mais barato que no exterior.

As contratações no mercado de óleo e gás, por sua vez, continuam em compasso de espera. No entanto, Karim Warrak, sócio-diretor da Asap Recruiters, consultoria de recrutamento e seleção de executivos, afirma que esse quadro tende a se modificar a partir de 2015, o que também beneficiará as movimentações no segmento de apoio marítimo.

Segundo ele, a previsão é que o Brasil dobre o volume de produção de petróleo até 2020 com o pré-sal. Em razão disso, novas plataformas vão começar a operar no país a partir do ano que vem - demandando profissionais não somente de nível técnico, mas também em cargos de gestão. "Será preciso contratar mais pessoas de suporte, de recursos humanos, de finanças e da área jurídica. Já começamos a sentir um movimento nesse sentido", afirma Warrak.