Autopeças: Importações sobem 20% no primeiro semestre

Importações sobem 20% no primeiro semestre

Na esteira do ciclo de valorização do real e da chegada de montadoras asiáticas ao país, a indústria brasileira de autopeças passou a conviver com duas situações difíceis no comércio exterior. De um lado, o setor vê a concorrência dos importados de diversas partes do mundo subir rapidamente no mercado interno, com a crescente entrada de produtos chineses e, agora, a disparada nas importações de autopeças coreanas.
 
De outro, a pauta de exportações está cada vez menos diversificada: mais da metade das exportações dessa indústria passou a se concentrar apenas nos vizinhos da América do Sul, sobretudo na Argentina, após a perda de mercados nos Estados Unidos.
 
A combinação dessas duas realidades - que, em comum, resultam da perda de competitividade dos fabricantes brasileiros perante a concorrência internacional - produz, desde 2007, déficits crescentes na balança comercial da indústria de autopeças. O ponto mais baixo dessa trajetória acontece neste ano. Só no primeiro semestre, as importações superaram as exportações em US$ 4,72 bilhões, o que representa um aumento de 60,6% no déficit das transações comerciais no mercado de componentes automotivos. Houve, no período, um crescimento de 20,4% das importações e um recuo de 2,4% das exportações.
 
Além da valorização do real a patamares menos competitivos para empresas exportadoras, os fabricantes brasileiros dizem que a escalada no custo da mão de obra e a alta carga tributária do país - somadas a deficiências de infraestrutura que tornam mais cara a logística industrial - tiraram do setor poder de fogo para competir com concorrentes estrangeiros.
 
Mas a mudança estrutural na balança comercial de autopeças, que até sete anos atrás operava com superávit, não se deve apenas a uma questão de competitividade. A melhora tecnológica dos carros vendidos no mercado brasileiro, por exemplo, levou ao maior consumo de sistemas não disponíveis no país, principalmente no campo da eletrônica. Ao mesmo tempo, a maior diversidade de montadoras instaladas aqui com produção local de veículos conectou o Brasil a novas fontes de suprimento, sem que isso significasse um aumento do fluxo na direção oposta - ou seja, a abertura de novos mercados para as exportações.
 
A Hyundai ainda importa blocos de motor e câmbio da Coreia, embora tenha levado nove fornecedores de seu país de origem à fábrica de Piracicaba (SP), onde produz o HB20, quinto carro de passeio mais vendido no Brasil. Situação parecida acontece com a Toyota, que já anunciou plano de investir numa fábrica de motores no interior paulista, mas, por enquanto, segue importando os propulsores do Japão, assim como as caixas de câmbio.
 
Coreia e China respondem hoje por 8,3% e 8,2%, respectivamente, das importações de autopeças no Brasil. Há doze anos, os dois países juntos mal passavam de 1% das compras externas nesse setor. Quando se inclui o Japão, responsável por 9,6%, mais outras origens da Ásia e, em menor escala, da Oceania, a participação da macrorregião chega a 35,9% do total, já muito próximo da Europa, que vende 39,4% de tudo o que o Brasil importa em autopeças.
 
Os números - compilados pelo Sindipeças, a entidade que representa a indústria brasileira de componentes automotivos - mostram que a política adotada pelo governo, há um ano e meio, de dar incentivos apenas a carros com alto conteúdo de nacionalização não conseguiu, pelo menos até agora, frear a entrada dos importados. Tampouco permitiu o impulso esperado pela indústria de autopeças, cujo faturamento caiu 10,5% em 2012 e não deve se recuperar totalmente neste ano, quando espera-se um crescimento das vendas inferior a 3%, conforme estimativa do Sindipeças.
 
No início de outubro, o novo regime automotivo vinculou descontos no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos carros à aquisição de componentes fabricados no Mercosul. Porém, Paulo Butori, presidente do Sindipeças, diz que o cálculo do conteúdo local, que define o abatimento do tributo, segue "livre, leve e solto", já que o governo ainda não definiu como vai rastrear a origem das peças. "Não há medição de nada hoje", afirma. A expectativa da entidade é que o déficit comercial das autopeças se aproxime da marca de US$ 10 bilhões até o fim do ano.
 
Setores ligados à essa cadeia vêm cobrando do governo uma série de incentivos para reverter o que chamam de desindustrialização da indústria de autopeças. O programa proposto já tem até nome: Inovar-Peças, uma alusão ao Inovar-Auto, como foi batizada a política de incentivos às montadoras. Contudo, Butori afirma que o governo não vai levar as propostas adiante enquanto o Inovar-Auto não estiver pronto, com a publicação das regulamentações finais. "Acho que estamos voltando atrás em nossa competitividade e muita gente está preocupada", diz.
 
Por Eduardo Laguna/ Valor Econômico