Há seis anos, o México era o nono maior exportador mundial de carros. Hoje, ocupa o quarto lugar, atrás da Alemanha, Japão e Coreia do Sul, com exportações que devem totalizar mais de 2,14 milhões de veículos este ano.
Um em cada dez carros vendidos no ano passado nos Estados Unidos foi fabricado no México. No ano que vem, todos os novos táxis da frota de Nova York, fabricados pela Nissan Motor Co., serão marcados com "Hecho en México". O México está agora exportando veículos para a China, e até ajudou o Japão a cumprir seus pedidos após o tsunami do ano passado.
O ministro da Fazenda do México, Bruno Ferrari, disse com orgulho que uma série de novas fábricas já planejadas pelas montadoras vão ajudar o México a superar a Coreia do Sul em poucos anos. Nomes como Volkswagen AG, Honda Motor Co., General Motors Co., Mazda Motor Corp., Fiat SpA, Daimler AG e Nissan anunciaram expansões no México no ano passado. A divisão Audi da Volkswagen planeja construir uma nova fábrica de US$ 1,3 bilhão.
Durante décadas, a indústria foi dominada por carros fabricados sobretudo nos EUA, Japão e Alemanha. Mas uma tendência global em direção a carros menores pressionou as margens de lucro, obrigando as montadoras a encontrar manufaturas mais baratas em outros países.
"O México é extremamente competitivo", disse Carlos Ghosn, diretor-presidente da Nissan, ao The Wall Street Journal. As fábricas no México operam mais horas por ano do que outras da Nissan no resto do mundo. "É possível fazer as fábricas operarem praticamente sem limites, se você quiser", disse ele.
Vantagens no câmbio e alta produtividade dos empregados mexicanos, disse ele, tornam o México ainda mais atraente.
A mão de obra constituía uma parcela menor do custo total de um veículo quando utilitários esportivos e caminhonetes eram altamente populares nos EUA. Mas a crise financeira no país vem estimulando os consumidores a comprar veículos menores e mais baratos, que têm margens de lucro menores.
Outro estímulo para a demanda por carros menores foi a decisão do governo americano, este ano, de quase dobrar a quilometragem por litro exigida para carros novos, com uma meta de 23 quilômetros por litro até 2025.
As novas normas devem aumentar a procura por veículos subcompactos, disse Guido Vildozo, analista da IHS Automotive, um grupo de pesquisas setorial. "E o primeiro lugar que vem à cabeça é o México, devido à mão de obra."
O salário de um funcionário mexicano de linha de montagem começa em US$ 40 por dia, segundo especialistas. É muito abaixo do salário mínimo obrigatório nos EUA ou na Europa, e se aproxima do salário médio das fábricas na China, que é de US$ 3 por hora. No ABC Paulista, um metalúrgico pode começar ganhando o equivalente a US$ 50 por dia.
As vantagens de custo ajudaram a convencer a Honda a abrir sua próxima fábrica no México, onde 3.200 novos funcionários vão produzir o subcompacto Fit a partir de 2014, disse Jesus Báez, o diretor executivo. O país tem um excedente de talentos, disse ele, incluindo engenheiros formados em programas direcionados para a indústria automobilística, financiados pelo governo.
As montadoras também são atraídas pela proximidade do México com o mercado americano. Fábricas no planalto central mexicano, onde se concentra a indústria automobilística do país, podem entregar carros novos nos EUA em questão de dias. Já o transporte marítimo pelo Pacífico ou o Atlântico pode levar semanas.
Os acordos de comércio internacional assinados pelo México nos últimos 20 anos ajudaram a impulsionar a indústria automotiva. Desde que o Acordo Norte-Americano de Livre Comércio, o Nafta, entrou em vigor em 1994, o México já assinou acordos comerciais com 44 países, incluindo Japão e Israel e membros da União Europeia.
Em contraste, o Brasil, outro gigante latino americano da fabricação de automóveis, tem basicamente mantido suas portas fechadas para o livre comércio.
Ferrari, o ministro da Fazenda do México, disse que o sucesso da indústria automobilística do seu país tem dificultado a ampliação de acordos de livre comércio com o Brasil. Durante uma reunião em Davos no ano passado, programada para discutir possibilidades de abertura comercial, disse ele, os brasileiros se queixaram de que o México estava exportando carros demais para o Brasil e exigiram um limite nas exportações.
O México concordou com um limite válido para três anos, basicamente congelando as exportações de automóveis no nível atual, de cerca de US$ 1,55 bilhão. Em junho, a Argentina, que tinha um acordo semelhante com o México de exportações sem tarifas, seguiu o exemplo do Brasil e impôs um limite.
"O problema que temos com a América do Sul é que somos mais competitivos", disse Ferrari. O ministério do Comércio do Brasil não quis comentar para esta reportagem.
O acordo decepcionou as montadoras que estão construindo novas fábricas no México, plantas que poderiam proporcionar uma penetração maior no mercado brasileiro. "A situação com o Brasil não é tão boa", disse Andreas Hinrichs, diretor-presidente das operações da Volkswagen no México.
A fábrica da Volks em Puebla é hoje a maior da empresa na América do Norte, com capacidade para produzir 2.500 carros por dia. Durante décadas, o antigo modelo do Fusca foi o carro mais popular do México, apelidado de "Vocho" naquele país.
Hoje, os carros fabricados aqui se destinam sobretudo à exportação para os EUA, Europa e China, para onde 2.800 Fuscas foram enviados no ano passado. A Volkswagen está investindo mais US$ 550 milhões em uma nova fábrica na cidade mexicana de Silao, para fornecer motores para sua planta de Chattanooga, no Estado americano do Tennessee
O acordo comercial do México com o Brasil e a Argentina permite que a Volkswagen evite um imposto de 35% na exportação de carros de fabricação mexicana para o Brasil. As caminhonetes Volks feitas na Europa têm que pagar um imposto de 25% ao entrar nos EUA, mas para veículos fabricados no México não existe imposto.
"Se eu posso vender esse carro no Japão, nos EUA e na América do Sul, então o México é o lugar certo para produzi-lo", disse Hinrichs, da Volkswagen.
A Nissan ficou decepcionada com a notícia das quotas de exportação do Brasil, que impedem a montadora de aproveitar sua fábrica no México para aumentar as exportações para o mercado brasileiro, o maior da América do Sul. Mas a empresa afirmou que seus veículos de fabricação mexicana podem ser vendidos em outros países, inclusive o próprio México.
Em 1966, a Nissan abriu sua primeira fábrica fora do Japão na cidade mexicana de Cuernavaca, concentrando-se primeiro no mercado local, e depois aumentando as exportações para os EUA e outros países. Outra fábrica foi inaugurada em 1982, na cidade de Aguascalientes.
A montadora começou a diversificar sua estratégia de exportações em 2009, quando a economia mexicana se contraiu em 6%, na esteira da crise financeira global. As vendas de carros novos nos EUA e no México despencaram. A Nissan México demitiu funcionários e cortou salários e horas de trabalho dos que ficaram.
José Muñoz, então presidente das operações no México, fez um pedido aos seus chefes na Nissan para manter as fábricas funcionando. "Vamos tentar produzir no México os veículos que estavam sendo fabricados no Japão", ele se lembra de ter dito. Os executivos também destacaram a proximidade do México do crescente mercado latino-americano.
A empresa concordou. A qualidade do trabalho nos veículos mexicanos era comparável à dos carros feitos no Japão, e o preço de fabricação era menor. Desde então, a Nissan triplicou o número de mercados de exportação a partir do México, para cerca de cem em todo o mundo. A Nissan México produz mais de 600.000 veículos por ano, empregando 15.000 funcionários.
A produtividade do país definiu novos parâmetros para o setor. Por exemplo, a fábrica da Nissan em Aguascalientes experimentou um novo esquema de produção que permitiu operar 23 horas por dia, 6 dias por semana. Estudos realizados pela Nissan sobre seu compacto Versa, feito no México, mostraram um nível de qualidade igual aos carros da sua fábrica de Oppama, no Japão.
A Nissan México foi fundada com investimentos e experiência vindos do estrangeiro. Agora, uma fábrica no Brasil é comandada por um ex-engenheiro de uma fábrica mexicana, disse Armando Ávila, que dirige a produção no México.
A fábrica da Nissan no México antes ficava em segundo plano em relação às fábricas americanas, pois o México só começava a produzir um modelo depois que a produção nos EUA tinha atingido a capacidade máxima.
Mas, para o novo Sentra, um compacto que custa US$ 16.000 nos EUA, a fábrica de Aguascalientes será o carro-chefe, e a outra, nos EUA, vai completar o que faltar. "Antes, a produção tinha uma segunda vida no México", disse Bill Krueger, diretor de manufatura da Nissan na América do Norte. "Neste caso, são os EUA que agora vêm atrás."
A ascensão da indústria automotiva do México é um ponto positivo em um país notório pelo tráfico de drogas ilegais. Nos últimos seis anos, conflitos entre quadrilhas rivais já causaram pelo menos 60.000 mortes, fazendo muitas empresas pensarem duas vezes antes de investir no país.
O ministro Ferrari disse que já recebeu telefonemas de executivos preocupados. A fábrica da Honda no México fica perto de Guadalajara, uma das cidades mais violentas do país. Báez, diretor da Honda no México, disse que até agora nem a fábrica nem seus funcionários foram incomodados por traficantes de drogas.
Assim mesmo, disse ele, a Honda está construindo sua próxima fábrica na cidade de Celaya, que tem um dos índices de criminalidade mais baixos do país. A maioria das montadoras evita a fronteira EUA-México, onde cidades industriais como Ciudad Juárez vêm sofrendo mais que as outras com a guerra das drogas.
Por Nicholas Casey/ Valor Econômico