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Um estudo desenvolvido no Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT) do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp revela o perfil dos inventores das universidades públicas paulistas (Unicamp, USP, Unesp, UFSCar e Unifesp) na condição de agentes ativos do processo de patenteamento acadêmico. De acordo com o autor do trabalho, o engenheiro de produção Rodrigo Maia de Oliveira, o estudo mostra que, de modo geral, o inventor possui um perfil academicamente maduro, ocupa um cargo elevado na carreira docente como professor titular, possui titulações em vários níveis (mestrado, doutorado e pós-doutorado), orientou mais de dez alunos de pós-graduação, é bolsista nível 1 do CNPq e lidera pelo menos um grupo de pesquisa deste fomentador.
Os inventores em série, expressão da literatura utilizada pelo autor, já acumularam experiência sobre o processo de patenteamento a ponto de perceber quando determinada pesquisa apresenta potencial de comercialização e aplicação industrial. Os entrevistados declararam que a decisão de patentear geralmente ocorre do meio para o final da pesquisa. Isso mostra, segundo Oliveira, que, apesar de terem faro para a propriedade intelectual, esses inventores acadêmicos não costumam fazer uma classificação do que é ou não patenteável antes de começarem a desenvolver a pesquisa.
Para Oliveira, o perfil encontrado na pesquisa mostra a forte orientação que os critérios do sistema acadêmico de avaliação e recompensa exercem sobre o comportamento do pesquisador. Um exemplo disso é a bolsa de Produtividade em Desenvolvimento Tecnológico e Extensão Inovadora (DT) promovida recentemente pelo CNPq, a qual passou a ter os mesmos benefícios e características equivalentes à bolsa de Produtividade em Pesquisa (PQ). “Dentro de poucos anos é possível que se observe um processo de migração dos inventores que inicialmente tinham bolsas de Produtividade PQ para DT”, acrescenta Oliveira.
Na avaliação dos pesquisadores entrevistados por Oliveira, o envolvimento com o processo de patenteamento e comercialização da pesquisa acadêmica deve ser considerado como uma experiência claramente positiva, com contribuições significativas para o nível de aprendizado dos próprios pesquisadores e de seus alunos. Foram entrevistados 14 inventores das instituições de ensino analisadas.
A partir de dados coletados na base de patentes do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) e junto aos Núcleos de Inovação Tecnológica (Nits), Oliveira verificou que enquanto a atividade de patenteamento acadêmico no Brasil era praticamente inexistente antes de 1980, no período mais recente, entre 2002 e 2007, houve um crescimento expressivo, alcançando em 2007 níveis próximos de 350 depósitos de patentes acadêmicas. Conforme a pesquisa, as cinco instituições paulistas respondem por 51% do número crescente de patentes de todas as universidades brasileiras até 2007, data em que o levantamento é finalizado.
Segundo Oliveira, a posição de destaque da Unicamp, ao lado da USP, é notável. Ele acredita que o volume de patentes depositadas reflete a vocação tecnológica da Unicamp, presente desde a sua criação, e o recente estímulo dado ao tema por meio da Agência de Inovação Inova Unicamp, criada no início dos anos 2000. “Lembre-se que a Unicamp não conseguiria depositar esse volume de patentes, e ser bem-sucedida nesse processo, se os seus pesquisadores não estivessem pesquisando assuntos com potencial de aplicação industrial”, acrescenta.
Para Oliveira, a liderança da Região Sudeste e das instituições de ensino superior paulistas reflete a concentração regional de instituições acadêmicas, pesquisadores e investimentos em atividades de pesquisa científica e tecnológica no Brasil. “Diante disso, é preciso propor políticas públicas que busquem regular, estimular ou organizar as questões da propriedade intelectual associadas às instituições acadêmicas. E seus pesquisadores deverão levar em conta as especificidades de cada região ou estado”, acrescenta.
O levantamento, segundo o autor, evidenciou o papel da Fapesp como principal parceira das patentes depositadas pelas paulistas. Ele explica que no convênio que a fomentadora firma com os autores para a concessão de auxílio financeiro à pesquisa há a exigência de que os resultados passíveis de proteção intelectual devem incluir a Fapesp como cotitular. Além disso, a agência também concede recursos para cobrir despesas iniciais do processo de proteção por meio de seu Programa de Apoio à Propriedade Intelectual (Papi/Fapesp).
Por outro lado, a pesquisa evidencia uma participação pequena das empresas na cotitularidade das patentes acadêmicas, o que, na opinião de Oliveira, denuncia a enorme distância a ser percorrida para que os resultados das pesquisas aplicadas se transformem em produtos e processos passíveis de ser utilizados pela sociedade. Em sua opinião, seria eficaz ter o parceiro industrial envolvido desde a definição do objeto da pesquisa, estratégia já adotada pela Unesp, que executa seu processo de transferência e exploração comercial por meio de contratos de parceria para o desenvolvimento tecnológico, segundo o autor.
Outro movimento ainda tímido no contexto das paulistas é em relação ao depósito de patentes no exterior, segundo Oliveira. Uma das hipóteses para esse resultado específico do levantamento é o custo elevado para processo de proteção no exterior e o potencial limitado de comercialização dessas tecnologias no âmbito global. “Mas essas explicações devem ser consideradas como hipóteses a ser verificadas”, explica.
Os principais resultados do trabalho mostram que o maior envolvimento dos pesquisadores brasileiros com o mundo das patentes ocorre a partir da década de 1990, e mais pronunciadamente a partir do ano 2000, na condição de pesquisadores formalmente contratados pelas suas instituições acadêmicas. O levantamento do número de patentes de todas as universidades realizado pelo pesquisador mostra, porém, que o primeiro depósito foi feito em 1971, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Impactos
Entre os impactos positivos diagnosticados na pesquisa, Oliveira destaca a aposta dos inventores na tese de que o envolvimento com as patentes contribui para a formação dos alunos de graduação e pós. Outra observação positiva é de que, apesar de a agenda de pesquisa sofrer redirecionamentos em virtude deste envolvimento, o pesquisador se sente livre para definir sua agenda. A incorporação das bases de patentes no conjunto de bases bibliográficas durante a condução das pesquisas e a alteração na rede de relações também são citados como impactos positivos pelo autor do trabalho. Para ele, o maior envolvimento com as patentes estreita as relações entre os grupos da indústria e os acadêmicos, multidisciplinares na maior parte.
Mas o autor pontua que alguns impactos negativos devem ser considerados, entre eles, a questão da imagem própria ou do grupo. “O maior envolvimento com as patentes gera o receio de discriminação do inventor e seu grupo de pesquisa por pesquisadores não-inventores”, declara. Ele acrescenta que, quando tudo é novo para o pesquisador e seu grupo de pesquisa, a atividade gera um gasto maior de tempo com o aprendizado do processo de redação, proteção e comercialização.
Algumas atividades seguem sem sofrer impacto do envolvimento com patentes, entre elas as escolhas de fontes de recursos para as pesquisas. De acordo com as entrevistas, os inventores não costumam identificar no licenciamento uma fonte de recursos que possa substituir o apoio das agências de fomento governamentais. O perfil dos alunos selecionados para a pós-graduação também não apresenta alterações. E os meios de divulgação dos resultados de pesquisas continuam sendo as revistas científicas e os congressos, seguindo sem alterações, segundo Oliveira.
De acordo com Oliveira, muitas mudanças ocorridas no âmbito acadêmico e também governamental, como a criação das NITs, o investimento em pesquisas e o aumento das pesquisas de doutorado interferiram no crescimento de depósitos. Entre os fatores estimuladores, Oliveira destaca aspectos históricos da formação da política, científica e tecnológica brasileira, como a adesão do Brasil ao acordo Trips em negociações políticas em esferas internacionais. Ele lembra que o Trips gerou alteração na legislação de propriedade intelectual brasileira, que em 2011 completa 15 anos. Oliveira também aponta como fatores relevantes para esse crescimento a intensificação da atividade acadêmica, as alterações no comportamento do pesquisador e a crescente valorização e incentivo à comercialização dos resultados da pesquisa acadêmica.
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