O impacto da crise global no mercado de trabalho brasileiro foi além do corte no emprego. De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, setores que não fecharam vagas fizeram uso da rotatividade para substituir na mesma ocupação um empregado de maior remuneração por outro de menor salário, como forma de reduzir custos com mão de obra.
Levantamento feito pelo presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcio Pochmann, a pedido do Estado, mostra que, em seis meses sob pressão da crise, a taxa média mensal de rotatividade no trabalho com carteira assinada atingiu 3,9%, ante 3,7% entre outubro de 2007 e março de 2008. Nesse período de dificuldades na economia, a rotatividade atingiu 23,4% dos cerca 29,4 milhões de trabalhadores formais do setor privado.
Isso seria como se praticamente um em cada quatro brasileiros com carteira de trabalho assinada trocasse de emprego no período.
Na realidade, a proporção é menor. Primeiro, porque muitos mudaram de emprego mais de uma vez. Segundo, porque parte das vagas foi ocupada por pessoas que ingressaram no mercado ou estavam desempregadas. Essa troca, contudo, na maioria dos casos motivada por demissão, implica em salários mais baixos.
"A rotatividade da mão de obra no trabalho é historicamente alta no Brasil, porque nossas empresas não enfrentam restrições para demitir e contratar", diz Pochmann.
Ele pondera que essa flexibilidade tem possibilitado que as empresas se ajustem nos períodos de crise, o que amortece o seu impacto no fechamento de vagas . Mas ressalta que o trabalhador que foi demitido e não conseguiu um novo emprego vai onerar os cofres públicos, porque depende do dinheiro do seguro desemprego, enquanto o que foi contratado para ocupar o seu antigo posto vai ganhar menos. "Para melhorar esse quadro, a economia precisa voltar a crescer", afirma.
Os setores que aumentaram a rotatividade não foram os que mais demitiram empregados formais. O setor terciário, que contempla o comércio e os serviços em geral, manteve o saldo positivo entre contratações e demissões, porém com aumento da rotatividade em relação ao período anterior. No comércio, a rotatividade média mensal subiu de 4,02% de outubro de 2007 a março de 2008, para 4,08%, entre outubro de 2008 e março deste ano.
"Mesmo antes da crise o comércio já trocava funcionários de uma forma selvagem", diz Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo.
Segundo ele, mais de 9,9 mil demissões foram homologadas no sindicato dos comerciários só em março, o que representa um aumento de 21% em relação às 8,2 mil homologações feitas em igual período de 2008. "É um verdadeiro absurdo porque, ao mesmo tempo em que cresce o numero de demitidos, na porta das lojas se vê placas anunciando vagas", afirma o sindicalista.
Sem benefícios
Na indústria, os efeitos da crise levaram ao fechamento de 692,6 mil postos de trabalho entre outubro de 2008 e março deste ano. A rotatividade caiu de 3,26% para 3,02%.
"Me parece uma taxa alta", diz o empresário Paulo Francini, diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). "Estamos falando de 3% e isso significa uma rotatividade no ano de 40%".
Na opinião de Pochmann, "o efeito da rotatividade sobre o mercado de trabalho é muito pior na crise". De acordo com ele, "até setembro, a demissão de um trabalhador com maior salário era seguida de contratação de mais pessoas com salário menor, porque a economia estava crescendo. Agora, a empresa demite um funcionário de maior salário, mas não tem capacidade de contratar muito mais."
A análise dos dados do Caged mostra que, para cada emprego com remuneração de até três salários mínimos eram contratados outros 25 com salários menores. Isso permitia reduzir em 13,3% o custo de contratação.
Em outras palavras, para um trabalhador que era contratado por R$ 1 mil, a folha crescia R$ 867. Agora, são abertas apenas duas vagas com a demissão de um trabalhador com remuneração superior a três mínimos . Nesse caso, o custo de contratação cai 69,4%. O trabalhador que ganha R$ 1 mil custa apenas R$ 306.
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