Fonte: Envolverde - 26/11/07
Foto: Divulgação
Por Heitor Scalambrini Costa *
Após a Constituição de 1988, as prefeituras passaram a assumir atribuições e responsabilidades até então de competência dos governos federal e estaduais.
A descentralização ocorrida aumentou a participação dos municípios no atendimento dos serviços públicos, entre eles a gestão e o monitoramento da energia.
Neste contexto, a contínua reestruturação do setor elétrico brasileiro, a crise do fornecimento de energia elétrica de 2001 e a problemática atual de mudanças climáticas ocasionadas, principalmente, pelo uso de fontes de energia de origem fóssil (petróleo, gás natural e carvão mineral) provocando o aquecimento global, vêm ocasionando enormes mudanças na administração municipal quanto à utilização deste serviço.
Para atender a esta nova demanda, a Gestão Energética Municipal traduz-se como um instrumento a ser utilizado pelos administradores municipais, consistindo basicamente na gerência, otimização e uso de novas fontes de energia. Agrupa um conjunto de princípios, normas e funções que garantem a otimização dos recursos financeiros municipais e a implementação de novas atividades com qualidade ambiental e eficiência energética.
Recente relatório preparado pelo Worldwatch Institute, intitulado Renewables 2005: Global Status Report constata que o aquecimento solar de água está se firmando como uma importante fonte de energia renovável no mundo. Constata que sistemas de aquecimento de água solar alimentam cerca de 40 milhões de habitações em todo o mundo, a maioria destas na China.
Leis que incentivam o uso de aquecedores solares são cada vez mais freqüentes. A obrigatoriedade do uso destes equipamentos foi implantada pela primeira vez em Israel, na década de 80. No final da década de 90, uma lei aprovada em Barcelona, acabou sendo incorporada no Código Nacional de Edificações Espanhol. A cidade do México aprovou recentemente lei semelhante. E cidades como Buenos Aires e Rosário, na Argentina, estão em processo de aprovação de projetos semelhantes.
O Brasil tem um enorme potencial para o uso da energia solar. Leis que incentivam o uso do aquecimento solar de água já foram ou estão em processo de tramitação em mais de 25 cidades, em diferentes regiões do país. O caso emblemático é Belo Horizonte, que com a atuação complementar entre a empresa elétrica Cemig e o Centro de Pesquisa Green Solar da PUC-MG permitiram nos últimos anos a instalação de mais de 2 mil sistemas solares em habitações multifamiliares e em conjuntos habitacionais de interesse social.
Outras cidades como Porto Alegre, Varginha, Campina Grande, São Paulo, Peruíbe, Birigui, Piracicaba, Rio de Janeiro, também já dispõem de leis sancionadas ou em fase de tramitação, apoiando o uso da energia solar.
Recife não poderia ficar atrás destas iniciativas. A Prefeitura do Recife, em parceria com a Universidade Federal de Pernambuco, assinou recentemente convênio de cooperação intitulado Recife: Cidade Solar, objetivando promover o uso de tecnologias energéticas renováveis, em particular a energia solar, no contexto do planejamento urbano de médio e longo prazos para o desenvolvimento sustentável. As metas apresentadas sugerem que agentes municipais tenham um papel importante na difusão destas tecnologias na construção de um futuro sustentável.
O convênio assinado prevê a instalação de sistemas de aquecimento solar de água, a construção de protótipos, a divulgação da tecnologia solar através de cartilhas, "folders", e a criação de legislação municipal que incentive o uso da tecnologia solar no município. Busca também aumentar a energia gerada por fontes renováveis, sustentáveis e descentralizadas, reduzir as emissões de carbono (efeito estufa) e de poluentes locais geradas pelas fontes energéticas fósseis, assim como reduzir a dependência da cidade de fontes de energia externas.
Recife:Cidade Solar prevê a criação de legislação que venha a incentivar o uso de coletores solares e fontes renováveis no município, em substituição aos chuveiros elétricos; a instalação de protótipos demonstrativos para atender as necessidades de água quente em residências de interesse social e a produção de eletricidade solar para atender a demanda de rádios comunitárias. Para a sensibilização e informação da população serão realizadas palestras em escolas públicas e produzido material didático sobre fontes renováveis de energia.
Estas ações, levadas a cabo pela Prefeitura do Recife e a UFPE promovendo o uso de energias renováveis, particularmente a energia solar, estão em consonância com a Agenda 21 Brasileira, com a Declaração do Rio de 1992, com a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima e seu Protocolo de Quioto, com a Constituição Brasileira e com a lei 6.938/81 que estabeleceu a Política Nacional do Meio Ambiente. Antes que o Brasil se renda ao apelo da energia nuclear ou aprove a construção de novas hidrelétricas e termelétricas, parece mais inteligente buscar formas de aumentar a eficiência e a conservação de energia, e de encontrar na diversidade das fontes renováveis as múltiplas saídas para o país.
* Heitor Scalambrini Costa é Professor da Universidade Federal de Pernambuco -
[email protected]