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Empresas investem em DEI e ampliam a participação de mulheres na indústria

Foco em ESG leva empresas a aumentarem investimentos em programas de inclusão e diversidade.

Sustentabilidade, inclusão, diversidade. Essas são palavras-chave no mundo dos negócios atual. Estes e outros conceitos estão dentro da gama de questões abrangidas pelo termo ESG, que tem ganhado grande visibilidade no mercado mundial. A sigla ESG é a abreviação de Environment, Social & Governance - Ambiental, Social e Governança, ou ASG no português. O conceito se refere às boas práticas empresariais que se preocupam com critérios ambientais, sociais e parâmetros de excelência em governança corporativa. Se, numa breve análise, o termo pode parecer abstrato, na prática ele já tem mudado a cara de empresas em todo o mundo. E um destes indicativos são os programas criados dentro de corporações para aumentar a contratação de mulheres.

Essa é uma tendência e uma necessidade. Segundo relatório da PwC, até 2025, 57% dos ativos de fundos mútuos na Europa estarão em fundos que consideram os critérios ESG, o que representa US$ 8,9 trilhões, em relação a 15,1% no fim do ano passado. Além disso, 77% dos investidores institucionais pesquisados pela PwC disseram que planejam parar de comprar produtos não-ESG nos próximos dois anos. No Brasil, fundos ESG captaram R$ 2,5 bilhões em 2020 – mais da metade da captação veio de fundos criados nos últimos 12 meses. Este levantamento foi feito pela Morningstar e pela Capital Reset.

Com essa pauta em alta, muitas empresas estão investindo em programas de inclusão e equidade, sobretudo em áreas historicamente masculinas, como a engenharia e a tecnologia. Angela Castro, líder do programa ALL IN da Deloitte, empresa líder em serviços de auditoria, consultoria, assessoria financeira, risk advisory e serviços relacionados, presente em mais de 150 países, analisa esse cenário. “Ainda hoje há profissões que estão diretamente correlacionadas a gênero, identidade de gêneros, tipo físico, situação econômica e outras infinidades de características, aparentes ou não. Isso faz com que elas sejam destinadas a um público específico, o que trai o princípio da diversidade, que é ter a representatividade da sociedade”, avalia.

Angela Castro
Angela Castro, líder do programa ALL IN da Deloitte.
Imagem: Divulgação.

O programa ALL IN, da Deloitte, é um dos exemplos de iniciativas criadas para aumentar a inclusão. “Hoje temos muitos trabalhadores em busca de colocação no mercado e, por outro lado, as empresas necessitam de profissionais qualificados. Como preencher essa lacuna? Como primeiro passo vamos entender que uma parte dessa lacuna é gerada por nossos vieses inconsistentes”, pontua Castro. 


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Na empresa, o programa se tornou uma estratégia global, “com pilares que visam a inclusão das mulheres, de pessoas LGBTQIAP+, pessoas com deficiência, profissionais de diferentes raças e etnias, talentos mais velhos, jovens aprendizes, entre outros”, explica a líder do projeto.

Para verificar o impacto destas ações, a Deloitte realizou a pesquisa de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) nas Organizações, realizada com apoio de instituições representativas das comunidades e grupos de afinidades. A pesquisa mostrou que, entre as empresas participantes, 81% possuem grupos de afinidades, sendo o mais maduro deles o de gênero. Além disso, 41% das empresas têm indicadores e 35% têm metas relacionadas à inclusão. 

“Entendo que sim, há empresas e profissionais que estão mais abertos a discutir e buscar conhecimento e há outras tantas que estão gerando impacto relevante através de ações consistentes na transformação social para diversidade e inclusão”, analisa Castro. Ela ressalta, porém, que são necessárias mais ações práticas: “A questão não é sobre a pressa para se apresentar como referência no tema, mas sim, sobre o como podemos de fato ter as melhores práticas de forma efetiva e verdadeira, e atingir a transversalidade da diversidade em toda companhia. E, para que essa transversalidade aconteça, é necessário conhecimento, e que o compromisso e visão da alta liderança estejam conectados de forma estratégica com a agenda ESG em sua real profundidade e complexidade”.

No caso do programa ALL IN, Castro desenvolveu um “passo a passo” de forma simplificada para que a empresa ampliasse a diversidade. Ele parte da criação dos grupos de trabalho para os temas priorizados; treinamento de toda a liderança; diagnóstico da diversidade e inclusão, permeando as áreas de RH, para avaliação da maturidade do programa; definição das ambições de longo prazo, com metas e compromissos; acompanhamento e revisão das iniciativas, metas e ações.

De participante de programa de inclusão a contratada pelo projeto

Com o intuito de contribuir para um universo mais igualitário na engenharia, ampliando o número de mulheres que lideram a evolução na Indústria 4.0, a Associação de Engenheiros Brasil-Alemanha (VDI-Brasil) lançou em 2020 o programa Industry4Her. Ele cria uma plataforma de interação, mentorias, capacitações, programas motivacionais e atividades para ampliar o networking e conhecimento das participantes. Atualmente, o programa está indo para a quinta edição. Cerca de 200 mulheres já passaram pelo Industry4Her.

Julia
Júlia Bertazzi, gerente de projetos na VDI-Brasil.
Imagem: Divulgação.

Júlia Bertazzi, gerente de projetos na VDI-Brasil, conta que a necessidade de criar o projeto foi verificada dentro da própria associação e das empresas participantes. “Começamos a nos questionar: como a gente fortalece as mulheres para que sejam protagonistas da transformação digital?”.

A demanda era tanta que já na primeira edição o programa recebeu 400 inscrições, e 24 mulheres foram selecionadas. Depois, o projeto começou a contar com empresas parceiras. Além de qualificar profissionais, o Industry4Her busca incluir mulheres que querem se recolocar no mercado de trabalho.

Era o caso de Rosani Alves, que participou da terceira edição. Ela ingressou no projeto com bolsa concedida a pessoas que buscavam recolocação profissional. Depois de 15 anos atuando na área de aviação, Rosani buscava uma nova experiência. “Foi tudo totalmente novo”, conta. Depois de participar do  Industry4Her, ela foi contratada pela própria VDI como assistente de projetos e hoje atua no programa que a qualificou para esta área. “Todas as mulheres chegam com as mesmas dores e levam outra visão para dentro das empresas. Elas têm a oportunidade de fazer algo diferente”, avalia Rosani.

Rosani Alves
Rosani Alves participou da terceira edição do
programa Industry4Her. Imagem: Divulgação.

Segundo os dados divulgados no Global Gender Gap Report 2022, pelo Fórum Econômico Mundial, o Brasil ocupa o 94º lugar no ranking mundial, composto por 146 países, no quesito disparidade de gênero no trabalho. A participação das mulheres em cargos político, sênior e gerencial diminuiu 1% em relação ao último ano, enquanto a proporção de trabalhadores do sexo masculino na mesma categoria aumentou proporcionalmente. Já a igualdade salarial teve aumento de apenas 0,017%, que é considerado uma melhora. O estudo aponta ainda que, no ritmo atual de progresso, levará 132 anos para atingirmos a paridade total. 

Imagem de capa: Depositphotos