Fonte: Envolverde (www.envolverde.com.br) - 26/02/07
O México pretende instalar até três mil aerogeradores no istimo de Tehuantepec até 2030. Camponeses duvidam dos benefícios sociais do projeto e cientistas alertam para potenciais ameaças às aves.
MÉXICO, 26 de fevereiro (Terramérica).- Com a benção de agências de desenvolvimento, multinacionais e ambientalistas, o governo do México capina terras para implantar a energia eólica. Porém, camponeses e especialistas em aves discordam. O objetivo do governo é que a geração de eletricidade pelo vento, que representa apenas 0,005% do total, chegue a 6% em 2030. Alcançar essa meta exige a instalação de mais de três mil aerogeradores na principal região de ventos do México – o istmo de Tehuantepec, no Estado de Oaxaca –, aos quais deverão somar-se dezenas de outros em diversos lugares do país.
Para colocar estas pás de aproximadamente 27 metros de diâmetro montadas sobre torres elevadas é preciso negociar com os donos dos terrenos, na maioria camponeses, alguns dos quais denunciam que foram enganados quando foi criada a primeira usina eólica, em 1994. Por outro lado, especialistas em aves alertam que muitas espécies correm risco de morrer nas pás gigantes, provocando uma reação ambiental em cadeia em todo o continente, pois várias são migratórias. “Tudo está feito de modo a facilitar as instalações eólicas, mas não existe um interesse maior pelas aves, o que a longo prazo pode acarretar grandes problemas”, disse ao Terramérica Raúl Ortiz-Pulido, porta-voz da seção mexicana do Conselho Internacional para a Preservação das Aves.
Este cientista reconhece que a questão das aves é considerada no desenvolvimento de cada projeto, porém “de maneira incompleta e incorreta”. Não é a mesma coisa avaliar o efeito de um projeto, no qual serão instalados poucos aerogeradores, e avaliar o impacto de vários projetos, com dezenas desses aparelhos, tal como está planejado para a região do Istmo de Tehuantepec, ressaltou. Será o efeito conjunto que afetará as aves, explicou. Contudo, as autoridades asseguram que os planos oficiais levam seriamente em conta a questão ambiental.
“Em qualquer projeto há pessoas a favor e contra, e ao longo do tempo as experiências de outros países provaram que os projetos eólicos trazem muitos beneficios às comunidades e que não há impactos ambientais importantes”, disse ao Terramérica Marco Borja, que comanda um projeto voltado à avaliação do recurso eólico no país a partir do estatal, mas independente, Instituto de Pesquisas Elétricas, com apoio do Fundo para o Meio Ambiente (GEF, sigla em inglês).
Nos últimos dois anos, as autoridades prepararam normas para incentivar o aproveitamento do vento, e desde dezembro submetem a consulta pública uma nova regulamentação, que ordenará o uso dessa energia do ponto de vista ambiental, e poderá entrar em vigor em março. Para dar mais incentivo ainda, conseguiram um crédito não reembolsável do GEF de US$ 25 milhões, concedidos pelo Banco Mundial. Esse valor, somado ao que recebe o Instituto de Pesquisas Elétricas e que chegou ao GEF por meio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), se traduz em um apoio de quase US$ 30 milhões.
A meta é impulsionar uma fonte cuja capacidade geradora cresce no mundo mais de 30% ao ano, reduzindo a dependência dos combustíveis fósseis. Na norma ambiental para as instalações eólico-elétricas agora em discussão, as autoridades propõem eliminar os estudos de impacto ambiental, exigidos em outros projetos. O requisito será substituído por um “informe preventivo”, que tem menor categoria e alcance. Na introdução da nova norma, que por lei deve ser submetida a consulta pública por 60 dias, prazo que termina no final de fevereiro, se reconhece que as instalações eólicas podem ter “impacto sobre a avifauna”.
Em seu alegado diz que o responsável pelo projeto deverá fazer um “inventário de espécies que utilizam a área, detalhando as relações entre elas para determinar as repercussões do deslocamento de algumas, épocas de acasalamento, nidificação e nascimento”. Isso será insuficiente para a região do Istmo, insistem os cientistas. Por esse lugar transitam anualmente seis milhões de aves, entre elas 32 espécies ameaçadas de extinção e nove endêmicas. “Somos acadêmicos e não ativistas. Já não sabemos como fazer com que nossos alertas cheguem às autoridades”, disse Ortiz-Pulido.
Em La Venta, que é parte do município de Juchitán, em Oaxaca, se concentra a maioria dos planos oficiais para instalar aerogeradores. É uma região empobrecida de aproximadamente 150 mil habitantes, em sua maioria dedicados à agricultura e pecuária. Ali, os camponeses também estão inconformados com os planos oficiais. “Os donos das terras foram enganados com acordos armados, pagos por arrendamentos de terra ridículos (para instalar os aerogeradores) e impedimentos para plantar. Já não permitiremos mais planos”, disse ao Terramérica Alejo Girón, líder do Grupo Solidário La Venta.
Em 1994, nesta localidade, teve início o primeiro projeto eólico, chamado La Venta I, e nos últimos dois anos prosseguiu com La Venta II. Agora, o governo de Felipe Calderón anuncia que licitará La Venta III e que em seguida virão outros, como o plano Oaxaca e La Ventosa. São projetos nos quais multinacionais, como a espanhola Iberdrola e a francesa Electricité, demonstram grande interesse, bem como firmas locais, como a produtora de cimento Cemex, que pretende instalar autogeradores para se auto-abastecer e, em vários casos, vender excedentes de energia à estatal Comissão Federal de Eletricidade (CFE).
Para concretizar esses planos é preciso convencer os donos das terras, aos quais a CFE paga, por cada um dos cem geradores já instalados em La Venta, menos de US$ 300 por ano, quantia entre dez e 20 vezes menor do que a que recebem moradores afetados em outros países, denunciou Girón. “Os projetos eólicos quase não criaram fontes de trabalho e não beneficiam os moradores próximos. Aqui nada mudou. Continuamos pobres, embora a CFE tenha prometido que isso mudaria”, disse ao Terramérica Feliciano Santiago, secretário municipal de Juchitán.
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