Apesar do discurso otimista do governo e, principalmente, do secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, o Brasil tem pagado caro para manter os investidores interessados em títulos públicos. A forte deterioração das contas federais, que minou a confiança, impôs um preço elevado que pode ser visto nos leilões de papéis realizados nos últimos meses.
Na mais recente emissão de dívida interna, em 7 de novembro, as Notas do Tesouro Nacional — Série F (NTN-F) saíram a 12,27% ao ano, o nível mais alto desde setembro de 2011. Já a captação no exterior, de US$ 3,2 bilhões, no fim de outubro, teve os maiores juros desde 2009, uma diferença de 180 pontos em relação ao títulos norte-americanos de 10 anos. Outros países da América Latina, a exemplo da Colômbia, têm obtido taxas melhores.
Toda a desconfiança que contaminou o mercado decorre dos truques fiscais usados para mostrar uma saúde que as contas públicas não têm. Para tentar minimizar o estrago que comandou, o secretário do Tesouro sempre argumenta que os investidores continuam colocando dinheiro no Brasil, por meio da compra de títulos federais. Ele só não revela que, para financiar a gastança, o elevado custo dos papéis está agravando o já frágil quadro fiscal.
Pelos cálculos do Banco Central, a conta de juros encostou em 5% do Produto Interno Bruto (PIB). Nos 12 meses terminados em setembro, os encargos somaram R$ 229,6 bilhões. Assim, mesmo com o governo poupando R$ 74,1 bilhões para bancar parte das despesas com a dívida, ainda faltaram R$ 155,5 bilhões para cobrir o rombo no período, o equivalente a 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB).
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, vem prometendo que, nos três últimos meses do ano, as contas públicas apresentarão números positivos, livrando o país de um “inferno astral”. Diante de tantas surpresas negativas e de promessas não cumpridas, poucos acreditam. “A questão fiscal deverá ser o calcanhar de Aquiles da economia brasileira durante algum tempo, uma vez que os resultados atuais são muito ruins. Também não há expectativa de melhora no horizonte. O governo parece não ter instrumentos para reverter esse quadro”, disse Luís Otávio de Souza Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil.
A fatura da gastança é enorme. Tanto que a dívida bruta, avaliada com lupa pelas agências de risco e por organismos internacionais, piorou nos últimos anos. Quando a presidente Dilma Rousseff assumiu o Palácio do Planalto em 2011, essa conta correspondia a 54,2% do PIB. De lá para cá, o número só cresceu e, em setembro, bateu em 58,8%. Para o Fundo Monetário Internacional (FMI) esse índice é ainda maior: 68,3%, patamar de países em crise.
“Ouvir o secretário do Tesouro Nacional dizer que o mercado está especulando com a política fiscal é uma daquelas coisas que gelam a espinha, fazendo relembrar os períodos mais nefastos dos anos de 1980”, afirmou André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos. “O mercado especula. Essa é a nossa função tanto quanto a da rendeira é rendar e a do pescador é pescar. Ver isso como ruim é tão contraproducente quanto exigir que um pescador pare de pescar porque mata os peixes”, emendou.
Nas contas de Felipe Salto, economista da Consultoria Tendências, de janeiro a setembro deste ano, a receita líquida do governo cresceu 2,2%, enquanto as despesas avançaram 7,2%. Para ele, esse descompasso evidencia o descontrole das contas. “Há um desajuste que é incompatível e que não reflete o discurso de austeridade fiscal do governo. Os dados mostram que o superavit primário (poupança para o pagamento de juros) desabou em pouco tempo”, observou.
Segundo Salto, no lugar de aumentar a eficiência e a austeridade da gestão dos impostos pagos pela população, “a administração Dilma mascara os números e usa a contabilidade criativa para construir um cenário que não existe”. Mas não é só isso. O excesso de gastos contribuiu para o aumento da inflação e obrigou o Banco Central a elevar a taxa básica de juros (Selic) em um momento em que a maior parte dos países reduz os encargos, porque a inflação está no chão. O caso mais recente foi o do México, que, preocupado com o desempenho econômico, baixou, em 25 de outubro, a taxa: de 3,75% para 3,50% ao ano.
Por Victor Martins/ Correio Braziliense