Pedidos ao BNDES sobem só 6% e podem afetar investimento

Pedidos ao BNDES sobem só 6% e podem afetar investimento

A insegurança que ronda a economia brasileira pode ter afetado também a disposição dos empresários para planejar novos investimentos. No primeiro semestre deste ano, o valor dos novos pedidos de financiamento que foram apresentados ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) superou em apenas 6% as consultas apresentadas no mesmo período de 2012.
 
O avanço se dá sobre uma base alta de comparação, mas mesmo assim, para economistas ouvidos pelo Valor PRO, o serviço de informação em tempo real do Valor, o dado reafirma um cenário econômico de incertezas, com lenta recuperação da indústria e da confiança do empresário. As alterações regulatórias, especialmente no setor de energia, também contribuem para um alongamento da desconfiança dos investidores.
 
O superintendente da área de Planejamento do BNDES, Cláudio Leal, disse que o banco não percebe tendências decrescentes gerais, mas reconhece a existência de um ambiente de instabilidade, com necessidade de "superar expectativas que tragam de novo tranquilidade para a decisão de investir". Para Leal, o segundo semestre será melhor, com a chegada dos projetos decorrentes das concessões na área de infraestrutura. Nos últimos dez anos, em média, 68% das consultas feitas em um ano se transformam em desembolsos nos 12 meses seguintes, embora essa relação oscile de um ano para outro.
 
"Se olharmos pela ótica dos desembolsos, eles cresceram bem. É verdade que a indústria não está bem, mas o volume de desembolsos no primeiro semestre deste ano é um fator positivo. Já o avanço das consultas em geral indica que a economia não está bem. O aspecto dos novos pedidos de financiamento condiz com o que estamos observando na economia", disse o economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério César de Souza.
 
As consultas feitas ao banco de fomento no primeiro semestre deste ano somaram R$ 124 bilhões. Na comparação como igual período de 2012, o detalhamento das consultas mostrou que 16 setores, de um total de 45, demandaram menos ao banco. As quedas ficaram, principalmente, com os segmentos da indústria extrativa (queda de 47,41% em relação ao primeiro semestre de 2012), química (recuo de 41%), equipamentos de informática, eletrônico e ótico (queda de 77,68%) e telecomunicações (recuo de 36,35%).
 
Segundo Leal, esse movimento reflete, em parte, ciclos de investimentos de determinados segmentos industriais, com oscilações normais, como telecomunicações e papel e celulose, por exemplo. Outras indústrias, como a extrativa, provavelmente fizeram fortes investimentos no passado recente, na avaliação do Souza, do Iedi.
 
Já setores mais ligados ao mercado externo, como química, farmacêutica e equipamentos de informática - que também apresentaram recuo nas consultas em relação ao primeiro semestre de 2012 - podem ter movimento explicado pelo cenário externo desfavorável e pela competição com produtos importados no mercado nacional, ainda na análise de Souza.
 
Para o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Mansueto de Almeida, ainda não é possível fazer uma leitura definitiva dos dados apresentados nas consultas para afirmar que há redução no apetite por investimentos por parte dos empresários. "A maioria dos setores que tiveram consultas maiores no primeiro semestre do ano passado, na comparação com 2013, teve padrão de consumo mensal irregular", disse Almeida. Ou seja, tiveram um mês ou outro com consultas muito elevadas, sendo o restante em média similar a observada nos primeiros seis meses deste ano.
 
Se por um lado não é possível afirmar que consultas menores em alguns setores são suficientes para, sozinhas, refletirem redução no apetite dos empresários, por outro elas servem como alerta para um cenário econômico que já não está tão favorável. Segundo economistas, esse recuo em alguns setores pode refletir que o esperado crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) está mais lento do que se previa inicialmente.
 
A demora na recuperação da indústria e redução no ritmo de expansão do emprego e do comércio, observadas nos resultados das pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ao longo deste ano, podem estar retardando a retomada da confiança do investidor. Para o Iedi, a expectativa dos empresários industriais em relação aos seus negócios precisa ficar mais firme e positiva para se observar efetivo aumento nas consultas ao BNDES. "Redução nas consultas em setores ligados a indústria de transformação indicam mercado interno mais fraco. Ninguém pretende investir se não houver cenário claro de recuperação econômica", diz o economista do IBMEC/ RJ, Gilberto Braga.
 
Para o diretor do instituto de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Carlos Frederico Rocha, a incerteza regulatória também influencia a decisão de investimento. As alterações no marco regulatório de petróleo e de energia elétrica, diz, deixaram empresas reticentes quanto à taxa de retorno dos projetos.
 
Por Elisa Soares/ Valor Econômico