Fonte: Valor OnLine - 19/06/07
Poucas palavras e mesmo expressões estiveram tão presentes nos últimos discursos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva como o biocombustível. E as aparições não escolhem lugar, até porque o presidente Lula costuma se referir ao produto como uma das alternativas futuras ao petróleo.
O fato é que o presidente Lula parece não estar mais sozinho. Portugal definiu que até 2010 pelo menos 10% de seu consumo de combustível deverá estar atrelado às fontes renováveis. Sendo assim, como explica o presidente do conselho de administração da Galp, Francisco Murteira Nabo, cuja empresa é dona de 37% do mercado português de distribuição de combustíveis, não há outra saída a não ser os biocombustíveis.
Portanto, foi assim, com esse cenário debaixo do braço, que a Galp e a estatal brasileira Petrobras ensaiam uma aproximação. Já com um memorando de entendimento firmado em maio deste ano, as companhias estudam agora a construção de uma refinaria capaz de processar 600 mil toneladas por ano de biocombustíveis. E a idéia é que esse projeto esteja em pleno funcionamento em 2010.
"Das 600 mil toneladas, 50% ficarão com a Petrobras e outros 50% permanecerão com a Galp", conta o executivo ao Valor. E mesmo sem revelar números de investimento e a localidade do projeto, Murteira Nabo assegura que a Galp não plantará um pé sequer em Portugal, ou seja, a empresa vai levar o produto pronto e acabado.
O fato é que a necessidade da Galp, que fatura 12,5 bilhões de euros por ano, não pára no projeto brasileiro. Na verdade, as 300 mil toneladas de biocombustíveis que serão obtidas por meio deste acordo somente corresponderão à metade da necessidade.
"Nossa estimativa é de 600 mil toneladas por ano a partir de 2010. Portanto, os outros 50% deverão ser obtidos em projetos que estamos formatando em Angola e em Moçambique", conta o presidente do conselho de administração. Aliás, Angola já tem uma participação na Galp. Por meio da estatal Sonangol, a companhia possui 45% da Amorim Energia, sendo que o restante pertence ao próprio grupo português Amorim.
Portanto, além dos 33% da Amorim Energia, a Galp tem ainda como acionistas o estado português (7%), a italiana Eni (33%), a espanhola Iberdrola (4%), o banco estatal Caixa Geral de Depósitos (1%) e possui 22% na bolsa de valores. A instituição financeira do governo, inclusive, tem direitos especiais. Um deles, por exemplo, é o de indicar o presidente do conselho de administração, e outro é ter a opção de compra, caso algum acionista resolva vender sua parte.
O fato é que para viabilizar a empreitada dos biocombustíveis no Brasil, em Angola e em Moçambique e de outros projetos, a Galp desenhou investimentos de 3 bilhões de euros para o período entre 2006 e 2010. E, desse total, 2 bilhões de euros serão usados na construção de usinas eólicas, centrais produtoras de energia a partir de gás e vapor e até no incremento da extração e produção de petróleo.
"Mas estimamos também 1 bilhão de euros para a conversão das duas refinarias que temos em Portugal. A idéia é que elas passem a processar petróleo pesado e não só o produto leve na produção dos combustíveis comuns, como óleo diesel", conta Murteira Nabo. Atualmente, as refinarias portuguesas processam petróleo comprado na Argélia e Nigéria, países suscetíveis a conflitos.
A dependência externa, portanto, é uma questão que está presente nos debates internos da companhia. Tanto que atualmente a Galp só possui um campo produtor de petróleo. Localizado em Angola, esse campo processa hoje 9,5 mil barris por dia.
Mas segundo o executivo, a empresa tem trabalhado na diminuição dessa dependência. E hoje já possui 55 blocos de prospecção sendo desenvolvidos no Brasil, em Moçambique e no Timor Leste. E os parceiros são os mais diversos. Vai desde a Sonangol, passando pela Petrobras e Shell, até a Eni.
Agora, mesmo sem uma visão definitiva de quando esses campos vão entrar em operação, o fato é que a Galp deseja ter 33% do consumo nacional de combustíveis saindo de áreas próprias de prospecção. "Atualmente, este número não passa de 7%", conta Nabo.
Diante de tantas iniciativas, o presidente do conselho de administração não tem dúvidas de que a companhia mudará sua cara no futuro. Se 56% da sua geração de caixa de 1 bilhão de euros registrada em 2006 decorre da distribuição, em 2010 a meta é que este segmento represente 50%. E a explicação é simples. "Queremos maior equilíbrio", encerra.
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