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Antônio Carlos Bonassa | 21/05/2024
Notícias
A globalização se baseia no princípio da especialização dos países, de tal forma que cada um produz aquilo que possui vantagem comparativa em relação aos outros. Consequentemente há uma fragmentação das cadeias produtivas e maior dependência das longas cadeias de suprimentos. O livre comércio é a regra de movimentação deste jogo, e estudos indicam parceiros comerciais que reduziram suas barreiras ao livre comércio tiveram resultado positivo em suas economias – aumento do PIB.
Mas, a globalização e o livre comércio vêm enfrentando desafios, e a situação não é diferente no Brasil.
Desde novembro do ano passado, os Houthis, um grupo paramilitar baseado no Yemen e apoiado pelo Irã, têm tirado vantagem de sua estratégica localização geográfica e já atacaram mais de 40 navios cargueiro que cruzavam o Mar Vermelho, um importante rota de passagem utilizada tanto pelos produtos asiáticos quanto pelo petróleo produzido no Golfo Pérsico com destino à Europa.
Os ataques fizeram com que empresas de navegação como Maersk e Hapag-Lloyd mudassem suas rotas de navegação para contornar o Cabo da Boa Esperança. Estima-se que o fluxo de navios pelo Mar Vermelho tenha caído drasticamente, em até 65%. Mais de 540 navios foram redirecionados, o que aumenta em média, 10 dias às viagens e adiciona um custo US$ 30 mil por dia extra de viagem, referente ao maior consumo de combustível.
Os custos das viagens aumentaram. De acordo com o Drewry World Container Index (WCI) o valor médio do frete em março de 2024 está 100% mais caro que o valor em dezembro de 2023 e a corretora de resseguros Guy Carpenter mostra que valor dos seguros passou de 0,07% nominais para percentuais entre 0,5% à 0,7% no final de dezembro de 2023.
A economista chefe da OCDE, Clare Lombardelli, em entrevista à CNBC, afirmou que um persistente aumento de 100% nas taxas de frete poderia causar um aumento de até 0,4% na inflação de seus países membros. Ryan Petersen, CEO da empresa de gerenciamento da cadeia de suprimentos Flexport afirma que a interrupção do comércio no Mar Vermelho por um ano poderia aumentar a inflação dos produtos em até 2%.
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Operacionalmente, segundo a Ocean Network Express o aumento do tempo de viagem da rota pela costa da África gera falta de capacidade de transporte uma vez que há navios suficientes disponível globalmente para cobrir estes tempos de trânsito muito longos. E no Brasil, Rafael Dagnoni, CCO do TECADI, afirmou que os armadores deixaram de levar contêineres vazios para repor em outras regiões, o que sobrecarregou os portos do Sul do Brasil e começou a afetar o porto de Santos”. Em contraposição, é esperada uma falta de container nos países do oriente.
Há informações de que a Volkswagen, temendo desabastecimentos como o que aconteceu com a Tesla na Europa, já começou a redirecionar os embarques de autopeças pela África do Sul. A escalada nos custos das cadeias de suprimento podem afetar os custos dos produtos importados pelo Brasil, principalmente dos produtos europeus que se utilizam de matérias primas e componentes vindos do oriente.
Além dos desafios operacionais, o Brasil também enfrenta dificuldades na conclusão de acordos comerciais, o presidente da França é abertamente contra o acordo Mercosul-União Europeia. O presidente Emmanuel Macron quer proteger seu pouco competitivo agronegócio. Conforme estimativa da CNI, a retirada do imposto de importação aos produtos brasileiros pela Europa fariam as exportações brasileiras aumentariam até alcançarem um ganho acumulado de US$ 11,6 bilhões em relação à 2022 e geraria um ganho de aproximadamente R$ 13 bilhões em produtos trazidos pela indústria de transformação brasileira.
Hoje a globalização convive com esforços de regionalização, um novo protecionismo, nos quais blocos econômicos e acordos bilaterais e multilaterais reconfiguram as práticas do livre comércio internacional. Historicamente o Brasil tem baixa participação nestes acordos e faz parte de um bloco econômico com dificuldades internas.
Diante desses desafios, é crucial que o Brasil desenvolva uma nova política de criação de valor interno que passe por uma industrialização de nossa economia, para se tornar mais atraente como parceiro comercial e mitigar os impactos negativos das interrupções nas cadeias de suprimentos globais.
De outra forma, nós brasileiros continuaremos a comprar produtos locais substancialmente mais altos do que o preço pago por consumidores de grandes blocos econômicos.
*Imagem de capa: Depositphotos
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Antônio Carlos Bonassa
Antônio Carlos Bonassa é especialista em gestão da cadeia de suprimentos nos segmentos de varejo, manufatura de equipamento, hospitalar, automobilística e de eletroeletrônico no Brasil e nos Estados Unidos. É professor no curso de Administração da ESPM, possui MBA por Purdue Universty (USA), mestre em Engenharia de Sistemas Logísticos e doutor em Engenharia de Transportes, ambos pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.
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